O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), por meio da 30ª Câmara de Direito Privado, recentemente analisou um caso emblemático envolvendo disputas sobre a penhora de dízimos e ofertas religiosas. A controvérsia surgiu no âmbito de uma execução de sentença contra a Igreja Mundial do Poder de Deus, que acumula uma dívida de aproximadamente R$ 150 mil relacionada a aluguéis, incluindo multas e encargos moratórios. No entanto, o colegiado decidiu negar o pedido de penhora dos dízimos, reconhecendo que a execução ainda não havia exaurido todos os meios disponíveis para busca de bens da devedora.
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A decisão apoia-se, sobretudo, no entendimento da excepcionalidade vinculada à constrição de doações religiosas e na salvaguarda das liberdades de culto e crença. Proferida pelo desembargador relator Marcos Gozzo, a sentença enfatizou a necessidade de recorrer primeiro a ferramentas como Renajud, Infojud e Arisp antes de determinar medidas drásticas contra a renda advinda das contribuições religiosas. Embora o credor tenha alegado esgotamento de algumas vias tradicionais, os magistrados concluíram que ainda há espaço para maiores diligências na identificação de bens passíveis de execução.
Liberdades religiosas e o limite da penhora
Uma das principais fundamentações para a negativa da penhora foi a proteção das liberdades religiosas, garantidas pela Constituição Federal. O juiz de primeiro grau, Caramuru Afonso Francisco, da 18ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, já havia se posicionado contrariamente à medida, mencionando que dízimos e ofertas representam contribuições voluntárias vinculadas ao exercício da fé, sendo essencial resguardá-las de intervenções diretas durante o culto.
Além disso, o magistrado argumentou que, para validar a penhora de tais valores, seria necessário identificar os responsáveis pelas doações, algo que não ocorreu nos autos do processo (agravo de instrumento nº 2118014-69.2024.8.26.0000). Ele ainda destacou que, por se tratar de um fluxo financeiro inserido no sistema bancário, a busca por ativos deveria ocorrer dentro das vias apropriadas de restrição patrimonial.
Meios de busca esgotados?
No decorrer do litígio, o credor obteve o deferimento de bloqueio de ativos bancários da igreja, no entanto, esse procedimento revelou-se infrutífero. Outro imóvel de propriedade da denominação também foi identificado, mas não pôde ser penhorado, pois já estava adjudicado em outro processo judicial. Como última alternativa, o credor requisitou a constrição dos dízimos coletados, alegando o esgotamento das demais possibilidades.
Todavia, o desembargador Marcos Gozzo ressaltou que a penhora do faturamento de uma entidade religiosa, como os dízimos e ofertas, só pode ser considerada após a realização de pesquisas abrangentes e detalhadas nas bases de dados disponíveis. Para isso, sistemas como:
- Renajud – para verificar restrições judiciais sobre veículos;
- Infojud – com acesso a dados da Receita Federal;
- Arisp – que fornece informações sobre registros imobiliários.
De acordo com o relator, essas ferramentas ainda não foram empregadas em toda sua extensão, tornando a medida de penhora dos dízimos precipitada neste momento.
Desdobramentos e impacto jurídico
Embora o pedido de penhora tenha sido rejeitado, a decisão traz importantes considerações para futuras execuções contra organizações religiosas no Brasil. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconheceu que doações recebidas por igrejas não estão automaticamente imunes de penhora, podendo ser direcionadas para a quitação de dívidas, desde que respeitados os trâmites legais. No entanto, o TJ-SP deixa claro que tal providência é uma medida extrema, válida apenas quando não houver mais alternativas razoáveis.
Essa determinação reafirma a importância do equilíbrio entre os mecanismos de cobrança judicial e a proteção de direitos constitucionais, como a liberdade religiosa. O credor ainda pode reiterar o pleito caso as consultas aos órgãos mencionados se mostrem igualmente infrutíferas, mas uma eventual penhora dos dízimos e ofertas só deverá ser implementada dentro dos critérios legais estritos.
Com base nos cálculos apresentados pelo credor, o valor a ser recuperado – estimado em R$ 150 mil – permanece como um desafio pendente no processo de execução. Resta acompanhar as próximas movimentações judiciais para verificar se a busca por outros bens fornecerá uma solução definitiva ao imbróglio.
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Redação
Redação jornalística da Elias & Cury Advogados Associados.