
A cidade de São Paulo terá de adotar medidas concretas para renomear vias e espaços públicos que atualmente homenageiam figuras ligadas à repressão do regime militar. A decisão, proferida pelo juiz Luis Manuel Fonseca Pires, marca um avanço no cumprimento das leis de memória e verdade.
Navegue pelo conteúdo
O município deverá apresentar um plano de ação em até 60 dias, promovendo o direito à memória política como forma de respeito aos direitos humanos e à democracia. A medida atende a uma ação civil movida por entidades ligadas à preservação da história.
Fundamentação da decisão judicial
A sentença, emitida pela 3ª Vara de Fazenda Pública da capital, reconheceu a omissão da Prefeitura de São Paulo na implementação efetiva da Lei Municipal 15.717/2013 e do Decreto 57.146/2016, que instituem a substituição de nomes de logradouros ligados à ditadura. De acordo com o juiz, ainda que exista um programa em andamento, sua execução permanece ineficaz.
A ação civil pública foi movida pela Defensoria Pública da União e pelo Instituto Vladimir Herzog, questionando a manutenção de homenagens a personagens associados a crimes como tortura, desaparecimento forçado e perseguição política. A Prefeitura, por sua vez, alegou que o programa "Ruas de Memória" estava em execução e que um novo projeto de lei (PL 896/24) estava sendo debatido na Câmara Municipal.
Contudo, o magistrado refutou os argumentos preliminares do município e reafirmou a competência da Justiça Estadual, além da legitimidade das entidades que apresentaram a ação. Em sua decisão, destacou que políticas formais sem efeitos reais configuram omissão administrativa.
Lista de locais a serem renomeados
A decisão judicial não só cobra a apresentação de um cronograma, como determina que ele contemple a substituição de nomes em 11 locais específicos, que atualmente reverenciam militares, delegados e médicos ligados a práticas repressivas e violações de direitos humanos. Entre os destaques estão:
- Avenida Presidente Castelo Branco: refere-se ao primeiro presidente do regime militar;
- Ponte das Bandeiras(homenagem a Romeu Tuma): ex-diretor do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS);
- Centro Esportivo General Milton Tavares de Souza("Caveirinha"): ligado ao Centro de Informações do Exército (CIE);
- Rua Dr. Mário Santa Lúcia: associado a laudos necroscópicos fraudados durante a ditadura;
- Rua 31 de Março: data que marca o golpe de 1964.
Outros endereços citados possuem vínculo direto com agentes de repressão e antigos membros de estruturas militares envolvidas em ações contra opositores do regime.
Direito à memória política e função do Estado
O juiz destacou que manter homenagens públicas a figuras envolvidas em graves violações compromete a Constituição Federal. A legislação brasileira, sobretudo a partir da Comissão Nacional da Verdade (Lei 12.528/2011), estabelece o dever do Estado em preservar a memória das vítimas do regime militar, combatendo atos que exaltem torturadores ou autoridades repressoras.
De acordo com a sentença, a promoção do direito à memória políticaé parte fundamental da construção democrática brasileira. O resgate da verdade histórica e a descontinuidade de homenagens consideradas ofensivas à dignidade humana integram um compromisso institucional com a democracia.
Além disso, o magistrado assinalou que essa reformulação simbólica dos espaços públicos ajuda a prevenir retrocessos autoritários, pois permite conscientizar futuras gerações sobre os riscos de regimes que violam as liberdades civis.
Cronograma e próximos passos
Com a sentença, a Prefeitura de São Paulo está obrigada a apresentar, no prazo de 60 dias, um cronograma detalhado de como será feita a substituição dos nomes. O plano deve ser público, progressivo e transparente, garantindo ampla participação da sociedade civil e observando os critérios já definidos no Programa Ruas de Memória.
Apesar de ter julgado procedente o pedido da Defensoria e do Instituto Herzog, o juiz optou por não restabelecer a tutela de urgência anteriormente concedida, citando decisão desfavorável em grau de recurso.
O processo está registrado sob o número 1097680-66.2024.8.26.0053e a íntegra da sentença pode ser acessada neste link oficial.
A decisão representa não apenas um ato jurídico, mas um marco na reafirmação dos valores democráticos e na transformação simbólica da paisagem urbana. Ao atender a legislação vigente, o município cumpre seu papel histórico de garantir memória, verdade e justiça para além dos registros oficiais, refletindo nas ruas o compromisso civilizatório com os direitos humanos.
Leia também:
- Atividades pedagógicas externas garantem aposentadoria especial de professor
- Direito Administrativo: Conceito, princípios e atuação profissional
- Entenda a necessidade de inscrição na OAB para advogados públicos
- Entenda Seus Direitos: um guia completo sobre Direito Administrativo
- Juiz mantém repasse de emenda parlamentar em MS
- Mendonça restabelece condenação a ex-prefeito por convênio irregular

Redação
Redação jornalística da Elias & Cury Advogados Associados.