
Um homem condenado a cumprir 15 dias de prisão permaneceu detido por mais de dois meses no presídio de Benfica, no Rio de Janeiro. A situação foi corrigida apenas após intervenção da Defensoria Pública, que conseguiu a expedição urgente de um alvará de soltura.
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A pena já estava cumprida desde o início de abril, mas, devido a falta de comunicação eficiente entre os tribunais e as unidades prisionais, ele seguia preso até o dia 10 de maio, quando o erro foi finalmente reconhecido pela Justiça.
Caso de prisão indevida no Rio de Janeiro
O caso veio à tona quando o defensor público Eduardo Newton, atuando pelo Núcleo de Audiência de Custódia da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, protocolou pedido de ordem liberatória para o homem. A solicitação foi realizada em um plantão do Judiciário fluminense, alertando sobre a prisão indevida do detento, cujo tempo de pena já havia sido cumprido.
O homem havia sido condenado pela 1ª Vara Criminal de Presidente Epitácio, em São Paulo, e começou a cumprir sua pena em 3 de março. Contudo, apesar de a pena ser de apenas 15 dias de detenção, ele continuou preso até 10 de maio — totalizando 68 dias em cárcere.
O juiz Antonio da Rocha Lourenço Neto, que estava de plantão, acolheu a petição e determinou a soltura imediata. Para ele, “não há justificativa jurídica para a manutenção do indivíduo recolhido, uma vez que sua punibilidade foi extinta pela Vara competente em São Paulo”.
Falhas no sistema de Justiça
O episódio expõe graves defeitos no fluxo processual entre varas judiciais interestaduais. A decisão que extinguiu a punibilidade do réu havia sido expedida em 3 de abril, mas até um mês depois nenhum alvará havia sido cumprido. Além disso, não há registros de que a administração penitenciária tenha confirmado o recebimento da ordem de liberação.
Conforme ressaltou o defensor, “o tempo já excedia em mais de quatro vezes o total da pena aplicada pelo juízo criminal”. Para a Defensoria Pública, trata-se de um exemplo extremo do que já se conhece como “prisão além da pena” — uma distorção no sistema que fere garantias mínimas de dignidade e Estado de Direito.
A decisão judicial que determinou a imediata libertação também destaca a inércia administrativa, apontando a necessidade de maior rigor nos procedimentos de cumprimento de ordens judiciais. O documento pode ser consultado no processo nº 0049803-70.2025.8.19.0001. O texto da decisão está disponível em formato PDF: Leia aqui a decisão
O papel da Defensoria Pública
Esse caso, além de ilustrar uma falha grave, também evidencia a importância da atuação da Defensoria Pública no combate a ilegalidades recorrentes no sistema penal. Sem a atuação ativa do defensor público, o homem poderia permanecer indefinidamente preso, mesmo sem fundamento legal para tal.
O defensor Eduardo Newton destacou que, infelizmente, episódios como esse não são isolados. A precariedade dos mecanismos de controle e a morosidade nos trâmites administrativos mostram que o sistema de execução penal brasileiro ainda falha em garantir os direitos fundamentais das pessoas privadas de liberdade.
Entre as providências recomendadas pela Defensoria estão:
- Ampliação do uso de tecnologias de comunicação entre varas e unidades prisionais;
- Fiscalização mais rigorosa do cumprimento de alvarás de soltura;
- Acompanhamento sistemático das penas em andamento e encerramento adequado.
Consequências jurídicas e institucionais
Apesar da soltura, o episódio pode gerar desdobramentos, inclusive com possibilidade de responsabilização do Estado por violação de direitos fundamentais. O homem que ficou preso indevidamente pode ingressar com pedido de indenização por danos morais, respaldado pela jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O artigo 37, §6º, da Constituição Federal prevê que o Estado é responsabilizado civilmente por atos lesivos causados por seus agentes, independentemente de comprovação de dolo. Embora o erro não tenha sido cometido com intenção, configura falha administrativa clara, com impacto direto sobre a liberdade do cidadão — um dos bens jurídicos mais protegidos pelo ordenamento legal.
Além disso, é esperado que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) avaliem medidas corretivas para evitar novas ocorrências desse tipo, que causam desgaste institucional à imagem do Judiciário. O caso ainda repercute como alerta para revisão das rotinas de comunicação entre instâncias jurídicas e órgãos carcerários.
Esse episódio evidencia, portanto, não apenas uma falha individual, mas um reflexo estrutural do sistema de Justiça e execução penal, com impacto profundo na vida de pessoas que, mesmo após quitação de suas dívidas com a Justiça, seguem encarceradas à margem dos próprios direitos.
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Redação
Redação jornalística da Elias & Cury Advogados Associados.