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Recuperação judicial continua sendo um tema de grande interesse para empresas, credores e órgãos reguladores, mas também é notório pela controvérsia em torno de aspectos como suspensões de execuções fiscais. Particularmente, as multas administrativas aplicadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) têm ganhado destaque graças à sua natureza excepcional dentro deste ambiente jurídico.
recuperação judicial e execução fiscal: visão geral do STJ
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reiterado que a suspensão das execuções fiscais, prevista no contexto da recuperação judicial (Lei nº 11.101/05), não alcança créditos de natureza administrativa ou tributária, mesmo com a introdução do § 7-B pela Lei nº 14.112/2020. A base dessa interpretação reside na ausência de distinção na legislação sobre a natureza do crédito.
Dois acórdãos relevantes exemplificam essa coesão jurisprudencial. O AgRg no CC nº 112.646/DF, sob a relatoria do Ministro Herman Benjamin, e o REsp nº 1.931.633/GO, da Ministra Nancy Andrighi, confirmam a resistência do STJ em admitir a suspensão de execuções fiscais no contexto da recuperação. Apesar disso, o cenário se transforma ao analisar a legislação aplicada especificamente às sanções impostas pela CVM.
Multas impostas pela CVM: o peso da normativa especial
As penalidades de multa aplicadas pela Comissão de Valores Mobiliários são objeto de uma abordagem distinta, baseada no § 15º do artigo 11 da Lei nº 6.385/76. Este dispositivo legal determina que essas multas são subordinadas ao processo de recuperação judicial e qualquer outro mecanismo que envolva concurso de credores.
A CVM, uma autarquia federal criada pela Lei nº 6.385/76, fiscaliza o mercado de capitais e aplica penalidades como multas a infratores de normas. A norma de subordinação contida no artigo 11 reflete uma lógica de harmonização, segundo a qual essas sanções se alinham à estrutura do processo de soerguimento empresarial.
Particularidades legislativas e hermenêutica aplicada
O caráter excepcional da lei que regula as multas da CVM está no fato de que ela é mais específica e posterior ao § 4º do artigo 4º da Lei de Execuções Fiscais (LEF), de 1980. De acordo com os princípios de hermenêutica, como o da especialidade, normas específicas prevalecem sobre normas gerais. Assim, o artigo 11, § 15º da Lei CVM configura-se como um caso especial em relação à Lei nº 11.101/05 e à própria LEF.
Outro ponto crucial é a compatibilidade com a lógica de que o fato gerador da responsabilidade deve ser anterior ao pedido de recuperação judicial para que o crédito se submeta à ordem de concorrência. Essa abordagem se alinha com a posição consagrada pelo STJ no Tema Repetitivo nº 1.051.
Conexão entre multas administrativas e planos de recuperação
Para as penalidades aplicadas pela CVM, caso o fato gerador da multa tenha ocorrido antes do pedido de recuperação judicial, há obrigatoriedade de submetê-la aos efeitos do plano aprovado. Isso está em conformidade com o disposto no artigo 49 e 59 da Lei nº 11.101/05, garantindo, assim, uma maior integridade no relacionamento entre credores e recuperanda.
Essa interpretação não afeta a visão consolidada do STJ em relação às multas administrativas de caráter geral, que tradicionalmente não sofrem suspensão. Contudo, reforça a relevância de normas específicas, como a incluída na Lei CVM, para a organização mais justa e eficiente de processos de recuperação.
Considerações finais: avanço e desafios
Apesar de posições bem fundamentadas na jurisprudência, o tema continua a demandar atenção em razão de nuances legislativas. A dualidade entre o entendimento do STJ sobre execuções fiscais e a aplicabilidade de normativas especiais como a da CVM só reitera a complexidade que permeia a recuperação judicial no Brasil. Essas questões apontam para a necessidade de maior clareza legislativa ou mesmo de consolidação jurisprudencial para garantir segurança jurídica às empresas e aos credores.
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Redação
Redação jornalística da Elias & Cury Advogados Associados.